A Escola-Universidade como espaçotempo de acolhimento
Apresento uma síntese de ideias e sentimentos emergentes ao
longo dos debates e conversas com diferentes coletivos de professores, pais e
estudantes em que participei nas últimas duas semanas. Pois, não estamos parados. Os colegas
professores e os profissionais da educação não estão parados.
Faz-se necessária uma análise crítica do SER professor em
tempos de Pandemia da Covid-19. Crítica para pensar, provocar discussões e, com
isso, possivelmente, visualizarmos ações conjuntas. E nisso precisa colocar-se
o gestor público, o gestor da escola e da universidade, a família e a sociedade
como um todo.
Em meio a esses pensamentos, lembro-me de uma frase marcante que
sintetiza esses dias atípicos, e que me faz escrever. Nela, diz-se que o “[...]
Professor não abandona seu Estudante e nenhum colega Professor”. Isso
significa olhar com atenção o SER professor, um sujeito com sentimentos,
angústias; que se apresenta incansavelmente na perspectiva de auxiliar,
construir alternativas e encontrar formas de estabelecer comunicação com os
estudantes, mesmo neste momento em que se perdeu o contato diário com eles, e
que a sala de aula está vazia. Não é mesmo?
Observa-se, diante do isolamento social, uma alarmante corrida para
transformar a educação presencial em atividades orientadas remotamente.
Registram-se inúmeras iniciativas de implementar plataformas e tecnologias
digitais. Busca-se estabelecer “uma normalidade” fantasiosa no envio de
atividades exigidas dos professores em tempo mínimo. Em alguns casos, criou-se
uma verdadeira overdose de materiais
e informações, e parece-me que,
com isso, tem-se a intenção de “salvar” as estratégias de ensino, certo?
Infelizmente, não!
A educação não pode ser limitada ao envio de atividades remotas. Devemos
assumir que foi um erro dos professores? Não. Alguém, ou nós mesmos exigimos
isso. Não é mesmo? Que espaçotempo
criamos para escutar e discutir com os colegas professores temas importantes,
como:
a) a aprendizagem dos estudantes;
b) o acesso às tecnologias digitais pelos estudantes e famílias; como
essas famílias compreendem esse processo; e
c) o que as crianças irão fazer com tudo isso?
Assumo, a partir desta reflexão, que os processos de ensino e de
aprendizagem são interligados, mas precisam ser reconhecidos como diferentes. Como
poderá acontecer o processo da aprendizagem dos estudantes nas atividades
remotas e/ou via plataformas digitais? É urgente abrir esse debate.
Devemos utilizar as tecnologias digitais para estabelecer comunicação
com os nossos estudantes e suas famílias? Sim. Entretanto, penso não ser o
momento para grandes invenções e/ou mudanças, como, por exemplo, a implantação
de ferramentas tecnológicas enquanto meio para desenvolver estratégias de
ensino e conhecimentos sistematizados. Ainda mais se isso for proposto para a
Educação Infantil, o Ensino Fundamental e o Ensino Médio. Desta forma, sugiro
algumas iniciativas com enfoque na escuta dos nossos estudantes, sobre o que
eles pensam sobre tudo isso e quais sentimentos eles têm em relação ao momento
que estamos vivendo.
As crianças, os adolescentes e os estudantes adultos são criativos, e
têm suas compreensões acerca deste contexto que precisam ser escutadas. Por que
não os desafiar a inventar, de forma colaborativa, músicas, poemas e reflexões
que nos auxiliem a significar esse momento? O atual cenário não é de
normalidade. É momento de pautar nossa visão mais no lado humano e menos no
ensino de um conhecimento sistematizado. Teremos tempo, depois. Espero que sim,
ainda que esteja angustiado por não saber.
Precisamos e temos o dever de lutar pela educação presencial. Esta sim,
precisa ser apoiada e melhorada em suas ações pedagógicas, com auxílio das
tecnologias digitais, quando retornarmos às atividades, possivelmente daqui a
dois ou três meses. E, afinal, as atividades letivas estão suspensas, ou não?
Se as atividades letivas estão suspensas, a quem interessa considerar aulas
remotas como atividades validadas?
Em síntese, quero dizer que:
1) promover uma mudança de cultura, com overdose
de informações e materiais, afasta a possibilidade de nossas crianças terem uma
EXPERIÊNCIA adequada às atividades remotas domiciliares; por isso, eu não apoio
a educação domiciliar;
2) sou contrário à implementação, ainda que não seja um anúncio oficial, de
atividades EaD ou Online no contexto
escolar. Sobretudo no Ensino Fundamental, o que considero um absurdo;
3) a modalidade EaD ou a “Educação Online”,
ou seja, a Educação a Distância, não se resume a atividades remotas;
4) não devemos aceitar que se use o termo “EaD” ou “Educação Online” para o que se está fazendo nesse
momento de emergência. Isso não é EaD e não é Educação Online;
5) acredito ser necessária a preservação da saúde
mental dos professores e estudantes envolvidos, pois estes não estão aptos, em
sua grande maioria, a operar, um sistema de ensino e muito menos os processos
de aprendizagem orientados exclusivamente por meios digitais, de forma remota;
6) menos atividades
conteudistas pode significar mais ações humanas;
7) muitos pais e professores têm atividades, além
dos cuidados destinados aos seus filhos em casa, o que impede uma atenção
integral das famílias e dos próprios professores a essas atividades remotas;
8) muitas atividades com enfoque conteudista, sem
possibilidade de interação com os professores e colegas, têm gerado ansiedade
nas crianças. Mesmo naquelas que têm a orientação adequada dos pais;
9) reconheço que todos
estamos diante do “diferente”, e que precisamos aprender de forma conjunta;
e que
10) precisamos reconhecer a Escola-Universidade como
espaçotempo de acolhimento de sentimentos e ideias, em que pais, estudantes e
professores possam falar e contribuir.
Desejo que, juntos, possamos debater/refletir sobre as temáticas
sistematizadas aqui. Tenho certeza de que nos tornaremos melhores enquanto
seres humanos e de que avançaremos na forma de pensar e praticar os processos
de ensino. Além disso, visualizo que muitos projetos criativos irão surgir.
Seremos transformados!
Possivelmente, olharemos para a aprendizagem de nossos estudantes como
central na construção da Educação. Então, que possamos juntos reconhecer que o
Professor não abandona seu Estudante, mas também, que precisamos olhar para o
SER Professor. Este não pode ser abandonado, não pode ficar pressionado a
executar suas ações unicamente de forma remota. Leitores,
por favor, escutem, percebam as suas angústias e acolham suas ideias.
Prof. Valmir Heckler, em 09/04/2020.
Professor do IMEF/FURG,
Secretário de Educação a Distância - SEaD/FURG
Líder do Grupo de Pesquisa CIEFI
Podemos continuar o diálogo neste espaço.
ResponderExcluirPrezado prof Valmir, vivemos tempos muito duros, parece que a mínima luz que havia no fim do túnel está se tornando muito lúgubre. Como professora aposentada, fico pondo -me no lugar de meus colegas das redes públicas e privadas. Os das redes públicas estão "convidados" a produzirem material a ser enviado a seus/suas estudantes,usando do princípio daqueles que constroem um avião em vôo. Já os das redes privadas estão sendo "provocados" a serem criativos ao elaborarem as aulas postadas nas várias plataformas digitais. E os/as estudantes como ficam? Os/As das redes públicas estão perdidos/as, muitos/as não têm comida em casa, quiçá internet banda larga. Os/as das redes privadas passam manhãs assistindo aulas on line, atropelados/as por inúmeras tarefas e atividades com prazos exíguos para a postagem. Alguns destes jovens inclusive acham-se no direito de derrubarem as plataformas, mas como dizem: "não deu nada, foi só uma brincadeira". O cenário é difícil, mas como membros do coletivo planetário, precisamos acreditar no princípio da superação para que de modo seguro possamos reencontrar um novo nascer do sol para a humanidade.
ExcluirPrezada colega, exatamente este o contexto vivenciado. A sua fala me instiga a continuarmos nessa luta conjunta e buscar nas experiências e escuta possíveis apoios para superarmos juntos este momento desafiador. Abraços Virtuais.
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